22/04/2020
A possibilidade de prorrogação do início da vigência da Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709/2018 – LGPD) para 1º de janeiro de 2021, aprovada na sessão deliberativa remota do Senado no dia 03 de abril intensificou os debates sobre os riscos que a decisão representa à proteção de dados dos brasileiros, o que o Estado ainda precisa providenciar para a lei entrar em vigor e como estão os esforços das empresas para se adequar à legislação. As multas e sanções foram prorrogadas para agosto de 2021. A decisão ainda depende de votação na câmara e sanção presidencial. Em função deste cenário, a ABES promoveu o
webinar Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD): Mudanças e Perspectivas, no dia 09 de abril.
Thomaz Côrte Real, especialista em Direito Empresarial, Tributário e Proteção de Dados e consultor jurídico da ABES, foi o mediador do evento, explicou que a proposta de prorrogação consta no PL 1179/2020 e que os debates em torno da proteção de dados e da privacidade estão em evidência, inclusive em função de iniciativas de monitoramento e geolocalização desencadeadas pelo surto da Covid-19.
O peso de mais um adiamento
Raissa Moura, da Inloco, associada da ABES, afirmou que a LGPD é uma lei moderna e alinhada com o mundo. Ela também pontuou que no Brasil ainda é difícil conversar com as empresas para que elas entendam que privacidade pode ser um diferencial, um investimento e, inclusive, um bom movimento para o desenvolvimento econômico e inovação. “A lei brasileira tem como característica colocar o titular dos dados no centro das decisões do que pode ser feito com seus dados. Sendo assim, os agentes que tratam dados terão que ter transparência absoluta e um olhar para os direitos fundamentais e humanos”, destacou. Raíssa alertou que as empresas estrangeiras e os investidores não sentem segurança no país por falta de uma lei de proteção de dados. “A LGPD já foi adiada por duas vezes e, se a lei já estivesse instituída, seria benéfica para o cenário de combate à Covid-19, uma vez que ela traz dispositivos necessários não só do ponto de vista de proteção de dados, mas também de base legal para o tratamento de dados”, avaliou.
Construção de uma cultura da privacidade
Na sequência,
Andriei Gutierrez, coordenador do comitê regulatório da ABES e do Movimento Brasil País Digital, destacou a importância da criação da LGPD para estruturar e trazer segurança jurídica para as empresas nos próximos anos. Também ressaltou que a lei traz confiança para o empresário, o consumidor e para o próprio Estado. “Por outro lado, não basta ter só a lei, é preciso ter a institucionalização da lei. As empresas precisam avançar, olhar para as boas práticas que há no mercado e cobrar do governo federal a estruturação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD)”, destacou. Andriei afirmou ainda que todos – governo federal, senado, setor privado e entidade empresarial – devem trabalhar para a cultura da privacidade, trazendo confiança, segurança e impulsionando o desenvolvimento econômico e social movido a dados.
A falta da Autoridade Nacional de Proteção de Dados
Fabricio da Mota Alves, advogado e representante do Senado Federal nomeado para o Conselho Nacional de Proteção de Dados, falou que colocar a lei em vigor sem a criação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) traz risco porque a legislação é subjetiva e não está regulamentada. Ele destacou que a prorrogação da data de vigência da LGPD é ruim de um modo geral e lamentou a prorrogação do artigo 53, que dá a determinação para a autoridade de dados consultar a sociedade sobre a forma que ela vai regulamentar as multas. “É prorrogada a aplicabilidade das infrações para agosto/2021, mas ao mesmo tempo a sanção só será trabalhada em agosto/2021”, disse. Para ele, a regulamentação pode demorar três anos e isso pode complicar, pois não há como obrigar o Presidente da República a promulgar a lei, principalmente, agora na pandemia, com tantos outros focos. Em sua avaliação, a prorrogação da lei é iminente e a Câmara dos Deputados vai chancelar a proposta do senado.
Investir na adequação da empresa à LGPD
José Antonio Batista de Moura Ziebarth, da secretaria de desburocratização, gestão e governo digital do Ministério da Economia, lembrou que a legislação tem alguns grandes pontos: segurança jurídica; alinhamento às práticas internacionais; e promoção de uma economia digital que busca medidas para estimular os mais variados modelos de negócio. Por outro lado, ele reconhece a dificuldade da iniciativa privada de escolher o melhor caminho para compartilhar os dados, pois sem a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) a estratégia para adequação à LGPD é prejudicada. “É importante ver que a implementação da LGPD não representa apenas custos para o setor privado. São investimentos que permitem modelos de negócios e acesso a mercados que seriam mais burocratizados sem a lei”, considerou.
Mais tempo para as empresas se adequarem
Para finalizar a participação dos convidados do webinar,
Marcos Sêmola, especialista em governança, risco e privacidade da consultoria EY, destacou que as regras no Brasil ainda não estão muito claras. Para ele, a lei traz benefícios ao transformar um assunto relevante em um tema mais popular e provoca desconforto nas empresas pelo risco de elas serem vistas como irresponsáveis no trato das informações que guardam dos clientes. Marcos explicou ainda que a lei cumpre um papel importante e a postergação da vigência da LGPD pode ser positiva e permitir intensificar a discussão em torno do tema. “As empresas ganharão mais um tempo para se preparem; a data da vigência da lei determina a largada para que as empresas demonstrem suas melhores condutas e de maneira sustentável”, concluiu.
Assista ao webinar na íntegra:
https://www.youtube.com/watch?v=0krH_htlE1k