20/01/2016
Por Jorge Sukarie, presidente da ABES
Uma discussão que estava adormecida há muitos anos voltou à tona recentemente com a publicação, no apagar das luzes de 2015, do Convênio ICMS 181 do CONFAZ (Conselho Nacional de Política Fazendária), que orienta a cobrança de ICMS pelas Fazendas Estaduais nas operações comerciais de software padronizado, com uma carga tributária de 5%.
A Lei nº 9609, de 1998, conhecida como a Lei do Software, define programa de computador como sendo a expressão de um conjunto organizado de instruções para fazer equipamentos funcionar de modo e para fins determinados. Não existe nesta norma nenhuma qualificação que possa distinguir o software para efeito de tributação A Lei Complementar nº 116, de 2003 - por meio do código 1.05 da lista de serviços - estabelece a cobrança de ISS (Imposto Sobre Serviços) nas operações de cessão e licenciamento de software. Desta forma, a exigência do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), conforme proposto no Convênio 181 do CONFAZ, configuraria bitributação, ato considerado inconstitucional no Brasil.
Talvez o cenário econômico adverso, com a necessidade de busca de arrecadação adicional, tenha feito com que as Fazendas Estaduais tenham decidido avançar na cobrança de ICMS em algumas operações realizadas com software, criando uma distinção entre “software padronizado” e “não padronizado” para poder atribuir ao primeiro a obrigatoriedade do recolhimento de ICMS. O fato é que o CONFAZ não tem competência para definir a incidência desse tributo sobre um bem e/ou serviço, sobrepondo uma Lei Federal, neste caso a Lei Complementar nº 116.
Desde 1992, ou seja, mesmo antes da Lei do Software (Lei 9609 de 1998), e da Lei Complementar 116 (2003), o Estado de São Paulo, por exemplo, cobrava ICMS nas operações com software somente sobre o valor do suporte informático (CD, DVD, Blu-ray, Manuais, etc.), reconhecendo que não tinha competência para cobrar sobre o valor total do software.
Em setembro de 2015, o Decreto 61.522 revogou esta legislação e o Estado de São Paulo pretendia passar a cobrar ICMS com a alíquota de 18% sobre o valor total das operações de venda de “software padronizado”.
Agora em janeiro, o governo de São Paulo já publicou um Decreto específico adotando as bases do Convênio 181 do CONFAZ, excluindo de cobrança do ICMS o software adquirido via transferência eletrônica “até que fique definido o local de ocorrência do fato gerado para determinação do estabelecimento responsável pelo pagamento do imposto”, de acordo com o texto. Assim, somente as operações com software acompanhado de meio físico terão cobrança de 5% no território paulista.
A Lei Complementar nº 116 prevê que, ainda que o software venha acompanhado de meio físico, ele não deve se sujeitar ao ICMS. Portanto, mesmo a cobrança deste tributo praticado pelo Estado de São Paulo até o final do ano passado - tendo como base de incidência o suporte informático - não era prevista na Legislação Federal. Ainda assim, algumas empresas de software estabelecidas no Estado optavam por recolher o ICMS por se tratar de um valor baixo de imposto, ainda que recolhessem também o ISS sobre o valor total da operação, sofrendo, portanto, bitributação em parte do valor.
Esse foi mais um capítulo do drama que o setor tem enfrentado no ambiente tributário inóspito brasileiro. Apesar de ser um dos setores reconhecidos pela sua capacidade de impulsionar a economia, o setor de Tecnologia da Informação viu, no ano passado, entrar em vigor a reoneração da folha de pagamento, a revogação dos benefícios da Lei do Bem que pode trazer de volta a informalidade ao segmento, entre outras medidas que atingiram sua atuação.
As empresas que decidirem pagar os dois tributos para não incorrer em autuação municipal ou estadual - pois não há notícias de que algum município deixará de cobrar ISS - provavelmente, vão transferir esse aumento tributário para os preços e, no final, o impacto negativo dessas sucessivas medidas vão refletir diretamente em toda a sociedade, que conta com a Tecnologia como um agente transformador e como um instrumento para alavancar negócios em todos os setores da economia.
Jorge Sukarie é Presidente da ABES e membro da entidade desde 1989. Formado em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas em 1986 e Pós-Graduado pela mesma instituição, em 1987, com ênfase em Finanças e Marketing. Com Curso de Especialização em Gerenciamento de Empresas na Harvard Business School em Boston (USA), Sukarie também é sócio-fundador e presidente da Brasoftware Informática (1987).